O Romance Moderno

Começamos o mês de Setembro com novo assunto. Seguindo nossa programação para 2020, o tema é o Romance Moderno.


Herdeiro direto da estrutura narrativa da epopeia clássica, o romance emerge – como o concebemos hoje – entre meados do século XVI e início do século XVII, especialmente na Espanha, expandindo-se em seguida pela Inglaterra, França e Alemanha. Já no século XVIII, o romance havia se transformado na mais popular de todas as formas literárias.
Em relação à epopeia, o romance traz importantes novidades:
- A metrificação (verso) é abandonada e a prosa de tom relativamente coloquial torna-se uma característica da linguagem narrativa.
- Por se estruturar a partir da dissolução da epopeia clássica e do declínio das novelas pastoris, galantes e de cavalaria da Idade Média, o romance emerge sem regras fixas ou modelos a serem obedecidos. Por isso, por não ter uma passado a guardar, ele se tornou a mais aberta de todas as formas literárias.
- Os personagens centrais – os heróis – deixam de ser o aristocrata guerreiro ou o grande homem de aventuras e conquistas, com os seus rígido códigos de honra e seus valores típicos da nobreza. Ao contrário, o que temos agora são homens comuns, normalmente de origem burguesa ou plebeia, e que vivem dramas corriqueiros. Suas ações já não lhes proporcionam fama e poder, mas giram em torno de fatos relativamente insignificantes: complicações sentimentais, sociais e financeiras, comuns a maioria das pessoas.
Os romances representam – já no século XVIII e XIX, mas particularmente no século XX – um verdadeiro mergulho no cotidiano, como podemos constatar em Moll Flandres, de Defoe, em Germinal, de Zola, ou em Os ratos, de Dyonélio Machado. Nesta última obra, aliás, toda a trama é concentrada na questão do pagamento de uma conta de leite, que o protagonista precisa saldar em vinte e quatro horas.
- Os personagens do romance já não são personalidades inteiriças e perfeitas. Agora a interioridade se dissocia da aventura e a alma fica fraturada entre os desejos íntimos e a realidade quase sempre hostil. Por viverem tal dualidade, os protagonistas apresentam uma complexidade maior. Portanto, a sondagem interior, mais tarde conhecida como análise psicológica, nasce com o romance.
- Os conflitos que embasam a epopeia clássica colocam em oposição apenas os personagens e a realidade exterior. No romance, ao inverso, ocorrem também dentro dos próprios protagonistas. É o chamado conflito interior. Isso não impede o choque dos indivíduos com o mundo, expressos sobretudo na lua dos mesmos contra as normas e os preconceitos sociais.
- Este último confronto torna-se clássico no romance: um indivíduo com valores autênticos tenta impô-los à realidade. Sede de amor, de justiça e de dignidade humana impelem-no ao desejo de mudança de um mundo, geralmente insensível e injusto. No entanto, o resultado desse esforço é, no mais das vezes, o fracasso. Desamparado, o personagem ou adere à ordem opressiva ou sucumbe à desilusão, à loucura e até à morte. Por isso, inúmeros romances se apresentam como um verdadeiro inventário de ilusões perdidas.
- Contudo, em muitas obras do gênero, há um triunfo do herói comum, seja pela realização de seus afetos ou de seus ideais, seja pela satisfação de suas exigências de escalada social, às vezes alcançada graças à sua esperteza e à sua flexibilidade ética.

- Estas diferenças entre a epopeia e seu mais ilustre descendente levaram o filósofo alemão Hegel, nos primórdios do século XIX, a cunhar a célebre afirmação: “O romance é a epopeia de um mundo sem deuses”, ou seja, o romance é a epopeia do cotidiano.
A busca da verossimilhança
Desde o seu início, o romance apresenta, em maior ou menor escala, uma forte índole realista pois os escritores buscaram elaborar uma síntese entre os dois elementos fundamentais do gênero:
- Personagens fictícios que vivem acontecimentos imaginários.
- O contexto histórico e as circunstâncias reais (costumes, espaço físico-geográfico, vida cotidiana, etc.) em que esses personagens se movimentam.
Dar ao leitor a impressão de que o enredo é um reflexo da realidade, fornecendo-lhe uma sólida e consistente descrição de múltiplos aspectos da existência humana, constitui o objetivo da expressiva maioria dos romancistas. No prólogo do ciclo de relatos que constituem A comédia humana (1830-1850), Balzac define sua tarefa como uma espécie de historiador do cotidiano:
Ao fazer o inventário de vícios e virtudes, ao reunir os principais feitos das paixões, pintar os caracteres, eleger os principais acontecimentos da sociedade, compor tipos mediante a fusão de vários traços de caráter, quem sabe eu poderia chegar a escrever essa história esquecida pelos historiadores, a história dos costumes.


Características do romance

O romance pertence ao gênero narrativo da literatura, pois apresenta uma sequência de fatos interligados que ocorrem ao longo de certo tempo. A marca principal desse tipo de texto é a relação temporal que se estabelece entre os fatos, mesmo que não sejam narrados na sequência temporal em que ocorreram, é sempre possível reconstituir essa sequência.

Um romance apresenta quatro elementos em sua estrutura: narrador, personagem, enredo e tempo.
Narrador – aquele que conta o que aconteceu na história. Ele faz parte da narrativa, é um elemento da estrutura, não devendo ser confundido com o autor. O narrador pode ser uma das personagens e relacionar-se com outras. Nesse caso é um narrador em primeira pessoa.
Personagens – são os elementos do texto que praticam as ações e provocam o desenvolvimento da história. São representações fictícias de seres humanos, que podem ser descritos do ponto de vista físico e psicológico. A personagem principal de um romance é chamada de protagonista.
Enredo – é o nome que se dá à sequência dos fatos da narrativa. A palavra enredo vem de rede, o que sugere um entrelaçamento de fatos. O enredo apresenta situações de conflito e a partir dele se chega ao tema, que é o motivo central do texto.
Tempo – as ações das personagens acontecem no tempo. Num romance pode existir o tempo cronológico e o tempo psicológico. O tempo cronológico é o tempo exterior, marcado pela passagem das horas, dos dias etc. Os fatos do enredo podem ser organizados numa sequência de antes e depois, isto é, numa sucessão temporal. O tempo psicológico é o tempo interior aquele que transcorre dentro das personagens. Por ser subjetivo, não pode ser medido ou calculado. É o tempo da memória, das reflexões.


Clicando na figura você encontra o romance "Vidas Secas" de Graciliano Ramos, com toda sua estrutura bem definida. Se quiser, pode enviar para nós um trecho de um capítulo de sua obra para ser inserida em nosso blog como maneira de dar a conhecer a sua produção literária.
Escreva para:
letrasnojardim@gmail.com







Referência: Criação Literária – Massaud Moises
Gêneros Literários – O Romance

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